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Topic: Overview: Regulamentação das Moedas Digitais no Brasil (Read 196 times)

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Criptorevolution
Parabéns Rafaela, uma excelente reflexão e levantamento de dados, continue trazendo para cá suas reflexões para que são de grande valor para a comunidade cripto brasileira
legendary
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bitcoindata.science
Excelente texto Rafaela. Resumão com várias informações diferentes sobre o assunto.

O Brasil, diferente de outros países, não chegou a uma conclusão acerca da natureza jurídica e econômica das moedas digitais. Ou seja, elas NÃO são legais, mas a operação com moedas digitais NÃO é proibida/ilegal. Se duas ou mais partes decidem realizar uma transação com bitcoin ou qualquer outra criptomoeda, o procedimento é juridicamente válido.


Sobre a natureza jurídica, por enquanto é vantagem que estejam considerando ocmo ativo financeiro, e não como moeda.
Operações de câmbio sofrem maior incidência de impostos do que ativos financeiros.

Fico feliz também que uma transação é juridicamente valida. Nosso país não está dos piores, pelo menos nesse assunto de croptomoedas
legendary
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Tem que fazer como no Japão e regulamentar como meio de pagamento. Resolve todos os problemas.
newbie
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sabotag3x, concordo plenamente com seu comentário. Sempre que eu leio "não reconhecemos as moedas digitais como moeda porque não podemos fazer a emissão dela, não reconheço como investimento, n reconheço como nada, mas quero os benefícios disso" eu penso em crianças que não sabem brincar e acabam com a brincadeira dos outros. Sério, só me vem na cabeça essa imagem.

Só um ponto, apesar da adoção ser pequena, a receita federal já disse que está "insatisfeita" com o número de declarantes em comparação com os dados de movimentações, então acho que vai ser uma pauta bem relevante sim. A minuta de uma instrução normativa definitiva da Receita Federal deve sair logo logo.

Obrigada pelo feedback, fico feliz que tenha gostado do texto.
legendary
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Excelente artigo que mais uma vez demonstra o mau caratismo do Estado..

"Não vamos reconhecer como moeda pois não queremos concorrência porém vamos taxar(roubar) cada vez mais com a desculpa do branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo."


Comparar o BTC com milhagem aérea é outra ofensa, pode ser apenas mais um caso de uso do BTC porém limita-lo a isso é triste.


Vamos ver como o Paulo Guedes vai tratar do assunto, porém não vejo como uma pauta urgente já que a adoção ainda é pequena..


Parabéns novamente pelo texto, bem completo!
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Sugiro que façam a leitura no medium para aproveitar melhor as imagens e links: https://medium.com/@rafaelaromano/overview-regulamenta%C3%A7%C3%A3o-das-moedas-digitais-no-brasil-ba72bbae472a

A pedido da e-juno, escrevi esse overview histórico da regulamentação das moedas digitais no Brasil, explorando os trâmites, projetos de lei e obrigações que constroem o cenário da regulamentação no Brasil.

Índice
1. Introdução

2. Bitcoin como “arranjo de pagamento”: Projeto de Lei 2303/2015

3. Conselho de Atividades Financeiras (Coaf)

4. Banco Central (BC)

5. Comissão de Valores Mobiliários (CVM)

6. Associações Brasileiras de Criptomoedas

7. Receita Federal (RF)

8. STJ, Mercado Bitcoin e Itaú: Recurso Especial 1696214/SP

9. CADE: Atlas, Banco do Brasil e ABCB: Inquérito 08700.003599/2018–95

10. Frente Parlamentar Mista de Blockchain e Ativos Digitais

11. Superior Tribunal de Justiça (STJ)

12. Conclusão

1. Introdução
Um dos pontos mais interessantes das moedas digitais é sua capacidade de questionar o modelo financeiro, político e social de diferentes sociedades. O desenvolvimento do mercado de moedas digitais desafia inúmeras instituições. O resultado é um complexo jogo político formado por Associações, Parlamentares, Projetos de Lei, Posicionamentos de Ministérios e Comissões e entidades públicas e privadas que buscam fazer valer seus interesses.

O Brasil, diferente de outros países, não chegou a uma conclusão acerca da natureza jurídica e econômica das moedas digitais. Ou seja, elas NÃO são legais, mas a operação com moedas digitais NÃO é proibida/ilegal. Se duas ou mais partes decidem realizar uma transação com bitcoin ou qualquer outra criptomoeda, o procedimento é juridicamente válido.

No ordenamento jurídico brasileiro, o bitcoin não é atrelado à economias estatais e nem é emitido por órgãos competentes e por isso não pode ser considerado uma moeda — embora performe vários aspectos definidores de uma moeda (pelo menos segundo a macroeconomia)-. Apesar da falta de regulamentação, as moedas digitais devem ser declaradas para fins de tributação e existem alguns processos legais em trâmite. Além disso, o governo brasileiro já emitiu alguns alertas sobre a intenção de regulamentação, salientando preocupações com volatilidade, segurança, AML (anti-money-laundering) e etc.

2. Bitcoin como “arranjo de pagamento” : Projeto de Lei 2303/2015
No dia 7 de julho de 2015, o primeiro Projeto de Lei sobre moedas digitais foi apresentado à Câmara dos Deputados pelo deputado federal Aureo (SD-RJ). O Projeto de Lei 2303 de 2015, dispõe sobre a inclusão das moedas virtuais e programas de milhagem aéreas na definição de “arranjos de pagamento”.

O Projeto foi distribuído pela Mesa Diretora às Comissões de Viação e Transporte (CVT); Finanças e Tributação (CFT) e Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC). A deputada Clarissa Garotinho (PR-RJ), apresentou seu parecer de rejeição da matéria. A deputada ressaltou não ser de competência da Comissão de Viação e Transportes (CVT) tratar da regulamentação das moedas digitais e também comentou que tratar as moedas digitais e os programas de milhagem como “arranjos de pagamento” trataria enfraquecimento do Banco Central e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF).

Após o parecer da deputada, o projeto foi retirado de pauta e apenas foi revisitado em 1° de dezembro de 2015 quando foi requisitado o posicionamento da Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços (CDEICS) e a Comissão de Defesa do Consumidor (CDC). A requisição fez necessária a criação de uma Comissão Especial -que só veio a ser constituída em 23 de maio de 2017- para tratar do Projeto de Lei 2303/2015.

Em 30 maio de 2017, Alexandre Valle (PR-RJ) foi eleito presidente da Comissão Especial, o deputado Lucas Vergilio (SD-GO), foi eleito 1º Vice-Presidente e Roberto Sales (PRB-RJ) entrou como 2º Vice-Presidente. O relator indicado da Comissão foi o deputado Expedito Netto (PSD-RO). A Comissão realizou inúmeras Audiências Públicas com figuras conhecidas do ecossistema de criptomoedas, tal como Rosine Kadamani, Helena Margarino, Gabriel Rhama, Rocelo Lopes, Marcelo Miranda, Felipe Trovão, Felipe Micaroni entre outros.

a. Objetivo das Audiências Públicas:

-Discutir e trazer mais esclarecimentos acerca de moedas virtuais;
-Debater os efeitos dos ‘Bitcoins’ como arranjos de pagamentos;
-Compreender os planos de fidelização e seus impactos juntos aos consumidores;
-Debater as possibilidade de crimes, no âmbito do mercado de moedas virtuais, e as suas implicações em relação aos consumidores
-Entender Novos Sistemas de Pagamento e seus impactos.

Segundo o deputado Aureo, propositor do Projeto, o aumento dos pontos de conexão entre as criptomoedas e a chamada economia real poderia ameaçar a estabilidade financeira do país. O autor também expressou sua preocupação com os usuários sujeitos a riscos de crédito, liquidez e falta de aparato legal para resguardar os consumidores.

b. Proibição do uso de moedas virtuais
Em dezembro de 2017, o Deputado Expedito Neto (PSD-RO), relator da Comissão Especial da Câmara dos Deputados propôs um texto voltado à proibição do uso das moedas virtuais no Brasil. Segundo o texto apresentado por Neto:

“ Não há, todavia, como evitar que moedas virtuais, digitais, ou criptomoedas sejam emitidas fora do nosso território e, portanto, que fiquem fora da abrangência das nossas regras. Nos compete, apenas, evitar que tais moedas sejam ofertadas à população, causando sérios problemas no âmbito da defesa da economia popular e da defesa do consumidor” e que “Nessa linha, naquilo que diz respeito às moedas virtuais, digitais ou criptomoedas, decidimos nos posicionar pela proibição de emissão em território nacional, bem como de vedar a sua comercialização, intermediação e mesmo a aceitação como meio de pagamento para liquidação de obrigações no País.”
Durante o mês de dezembro de 2018, a Comissão Especial destinada à proferir parecer ao Projeto de Lei n°2.303/2015, agendou para votar o Substitutivo do Projeto em questão. A reunião foi cancelada sem justificativa. O Substitutivo foi retirado da pauta da reunião mas ainda pode voltar a ser analisado.

O Substitutivo tinha como proposta por exemplo, detenção ou multa para aqueles que sem permissão legal realizassem emissão, intermediação, troca e armazenamento de moedas digitais que não fossem emitidas pelo Banco Central do Brasil.

Art. 3º O artigo 292 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar com a seguinte redação:

Pena — detenção, de um a seis meses, ou multa. § 1º Incide na mesma pena quem, sem permissão legal, emite, intermedeia troca, armazena para terceiros, realiza troca por moeda de curso legal no País ou moeda estrangeira, moeda digital, moeda virtual ou criptomoeda que não seja emitida pelo Banco Central do Brasil.

3. Conselho de Atividades Financeiras (Coaf)
Na Audiência Pública realizada dia 13/09/2017 na Câmara dos Deputados, o Conselho de Atividades Financeiras (Coaf), se posicionou favorável à regulamentação das moedas digitais e dos programas de milhagem aérea, defendendo que a regulamentação deveria ser feita pelo Banco Central e que apenas a fiscalização cabia ao Coaf.

Segundo o Coaf, a regulamentação das moedas digitais seria uma forma de impedir a lavagem de dinheiro, dando controle ao Coaf das operações realizadas. Segundo o diretor de Inteligência Financeira do Coaf, Antônio Ferreira:

“A grande preocupação do Coaf com todos os setores regulamentados, é que eles mantenham a política de prevenção ativa, que mantenham o cadastro dos clientes, os registros das operações e comuniquem ao Coaf [operações suspeitas]. Isso vale tanto para os negócios emergentes, mercados novos, como essa inovação das moedas virtuais, como para mercados tradicionais, como bancos, corretoras.”

4. Banco Central (BC)

Durante uma das audiências públicas realizadas pela Comissão especial da Câmara dos Deputados, o Banco Central se posicionou discordando do Projeto de Lei. O BC discordou da necessidade de regulamentação. Segundo manifestação:

“O Banco Central não reconhece as chamadas ‘moedas virtuais’, como moeda e nem tem a intenção de regulá-las como moeda.”
O Banco Central do Brasil, no comunicado n° 31.379, de novembro de 2017 alerta que as moedas digitais não são emitidas nem garantidas por qualquer autoridade monetária e não são lastreadas em ativo real de qualquer espécie. O comunicado destaca também que as moedas virtuais não se confundem com moedas eletrônicas de que trata a Lei nº 12.865, de 9 de outubro de 2013.

Por fim, o BC conclui que não havia sido observado a necessidade de regulamentação das moedas digitais no Brasil até a data de redação do comunicado, uma vez que o desenvolvimento desse mercado, não apresentava riscos relevantes ao o Sistema Financeiro Nacional. Entretanto, o BC, assim como outros órgãos governamentais está acompanhando as discussões internacionais acerca das atribuições dos órgãos na regulamentação das criptomoedas.

Quer saber sobre a regulamentação das moedas digitais em outras partes do mundo? Acesse o mapa da Regulamentação do Bitcoin: https://www.bitcoinregulation.world/Map

5. Comissão de Valores Mobiliários (CVM)
Em 12 janeiro de 2018, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) divulgou um Ofício Circular nº 1/2018/CVM/SIN proibindo gestores e administradores de fundos de investirem em moedas digitais, afirmando que as moedas digitais não podem ser qualificadas como ativos financeiros.

“A interpretação desta área técnica é de que as moedas digitais não podem ser qualificada como ativos financeiros, para os efeitos do disposto no artigo 2°, V, da Instrução CVM n°555/14, e por essa razão, sua aquisição direta pelos fundos de investimento ali regulamentados não é permitida”.
No dia 19 de setembro 2018, a autarquia publicou o ofício circular n°11/2018, autorizando os fundos de investimento de investir indiretamente moedas digitais , desde que admitidos e regulamentados nos mercados em que os fundos investem. A decisão vem em consonância ao posicionamento de outros países.

a. Posicionamento: ICOs
No dia 07 de março de 2018, a CVM emitiu um comunicado informando que até o momento de redação do comunicado, nenhuma ICO havia obtido dispensa ou registro de oferta pública de distribuição de valores mobiliários na Autarquia. A CVM destacou que irá regulamentar a oferta e negociação de ativos que se enquadrem no conceito legal de valor mobiliário, não estando em seu escopo de atuação os que não têm essa característica.

A discussão sobre o enquadramento de moedas digitais e tokens como valores mobiliários é um problema no mundo todo. Quer compreender melhor a questão dos tokens com valor mobiliário? Leitura o artigo o que é um token e entenda diferença entre tokens security e tokens utility.

Por fim, a autarquia recomenda que os investidores estejam atentos aos riscos associados aos investimento em ICOs, tais como fraudes, lavagem de dinheiro, riscos operacionais, de liquidez e desafios jurídicos.

6. Associações Brasileiras
Atualmente, existem duas Associações Brasileiras representando o setor das criptomoedas e blockchain. A Associação Brasileira de Criptomoedas e Blockchain (ABCB), fundada em abril de 2018 e presidida por Fernando Furlan, ex-presidente do órgão antitruste, Cade. E a Associação Brasileira de Criptoeconomia (ABCripto), lançada em setembro 2018 e atualmente presidida por Luiz Calado, CEO da exchange Braziliex.

Ambas as Associações já contam com mais de 35 associados e estão buscando, através de diálogo com agentes públicos, empresas do setor e pessoas físicas, fomentar a inovação e a livre concorrência do mercado de moedas digitais e blockchain em meio à obstáculos regulatórios. No tópico da Receita Federal e do Cade, é possível conhecer um pouco do trabalho que as Associações vem realizando.

7. Receita Federal (RF)
A Receita Federal (RF) não vê o bitcoin como moeda. Segundo o artigo 21 e o artigo 164 da Constituição Federal, apenas a União pode emitir moedas,sendo a emissão, competência exclusiva do Banco Central (Bacen). Ou seja, devido a impossibilidade das criptomoedas de serem emitidas por qualquer órgão governamental, elas não podem receber status de moeda.

a. Imposto sobre Ganho

Para a RF, as criptomoedas devem ser declaradas como “outros bens” e são equiparadas à um ativo financeiro. Os ganhos devem ser declarados com documentos que comprovem os momentos de compra e liquidação do ativo. E a cobrança do imposto de renda incide sobre os ganhos obtidos e com a alienações superiores a R$35 mil mensais, a título de ganho de capital, à alíquota de 15%.

A tributação no Brasil busca taxar investidores, em oposição à quem usa as criptomoedas como moeda, comprando bens e serviços. Dessa forma, apesar de não haver reconhecimento legal das criptomoedas como moeda, seu uso é efetivamente permitido. Em 2017, no “Perguntão” da Receita Federal, foram destinadas dois tópicos (447 e 607) específicos indicando o processo de declarar e pagar o imposto de renda no caso de ganhos com moedas virtuais.


b. Consulta Pública RFB n°06/2018
Em 30 de outubro de 2018, a Receita Federal lançou a Consulta Pública RFB n°06/2018, instituindo uma Instrução Normativa que obrigaria a prestação de informações relativas às operações realizadas com criptoativos pelas exchanges. A Instrução Normativa detalha instruções sobre as declarações de ganho, e emissões mensais das informações das operações dos clientes em reais, quantidade e valor negociado e criptoativos que foram negociados.

O documenta ressalta que só em dezembro de 2017, cerca de 4 (quatro) bilhões de reais haviam sido movimentados no Brasil com compra e venda de Bitcoin. Segundo a RF, a obrigação acessória de prestação de informações pelas exchanges viabiliza a verificação de conformidade tributária e aumentaria a eficiência do combate à lavagem de dinheiro e corrupção.

A Consulta, encerrada dia 19/11/2018 recebeu proposições de mudanças da Associação Brasileira de Criptoeconomia (Abcripto) e da Associação Brasileira de Criptomoedas e Blockchain (ABCB). Entre as sugestões, está o pedido de um prazo maior para o início do cumprimento das novas regras. Segundo o artigo 13 da minuta, a Instrução Normativa já estaria vigorando “na data de sua publicação no Diário Oficial da União” e produziria efeitos retroativos “a partir de 1º de outubro de 2018.”

As Associações também propuseram uma mudança no artigo 5° da minuta, trocando o valor mínimo de declaração das operações de R$10 mil para R$35 mil. Furlan, presidente da ABCB usou de parâmetro do argumento a lei 9.250/95:

“Quanto à obrigatoriedade das pessoas físicas, considerando que o art. 22, II, da Lei nº 9.250, de 26 de dezembro de 1995, com redação dada pela Lei 11.196/2005, isenta do Imposto de Renda das pessoas físicas o ganho de capital de bens em valor inferior a R$35 mil ao mês, crê-se que este é o valor mínimo para desencadear o dever de prestar informações”.
A Abcripto também propôs que as declarações fossem feitas semestralmente e não mensalmente, argumentando que esse é o caso das e-financeiras, regulamentadas pela Instrução Normativa 1.571/15 da Receita Federal.

O Instituto de Pesquisas Tributárias (IPT) também enviou algumas propostas à Receita. Entre elas, está a exclusão ou alteração das multas por descumprimento da nova obrigação acessória. Segundo Fabíola Keramidas do K&MC Advocacia, não é permitido à Receita criar penalidades por meio de instrução normativa, sendo necessário referência à alguma lei.

8. STJ, Mercado Bitcoin e Itaú: Recurso Especial 1696214/SP
A exchange Mercado Bitcoin entrou com um recurso especial contra o banco Itaú por encerramento de sua conta, alegando prática anticoncorrencial.

O Itaú argumentou que está seguindo as leis e normas de prevenção à lavagem de dinheiro e que a atuação das corretoras na identificação dos clientes, rastreamento da origem do dinheiro e notificação de operações de pessoas politicamente expostas não têm sido eficientes.

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu -no primeiro precedente do STJ sobre o tema- a favor do encerramento das contas das exchanges por 4 votos a 1. Segundo o STJ, as instituições financeiras NÃO violam a lei ao encerrarem contas sem justificava, uma vez que norma do Conselho Monetário Nacional (CMN) permite aos bancos encerrar contas após uma notificação ao cliente, sem necessidade de apresentar justificativa.

Durante o processo, a Associação Brasileira de Criptomoedas e Blockchain (ABCB) tentou ingressar como Amicus Curiae, o pedido que foi negado por unanimidade. A decisão a favor do encerramento das contas é uma marco na jurisprudência do mercado de moedas digitais, uma vez que foi a primeira vez que o assunto chega em segunda instância jurídica.

Infelizmente, a decisão abre precedente e outras instituições financeiras podem vir recebam o mesmo ponto de vista do órgão, visto que é muito difícil que um tribunal de justiça vá na contramão de um precedente do STJ.

A batalha entre instituições financeiras e instituições de criptomoedas entretanto, não se restringem ao judiciário. O mesmo assunto também foi levado ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) pela Associação Brasileira de Criptomoedas e Blockchain (ABCB).

9. CADE, Atlas, Banco do Brasil e ABCB: Inquérito 08700.003599/2018–95

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), autarquia federal brasileira responsável por fiscalizar, prevenir e apurar abusos nocivos à livre concorrência, iniciou no dia 18/09/2018 um inquérito contra instituições financeiras que estariam abusando do poder de mercado de forma a prejudicar as empresas de criptomoedas.

A investigação, iniciada à pedido da ABCB em 1/6/2018, representa o caso de encerramento da conta corrente da empresa de arbitragem de Bitcoin, Atlas — sócia mantenedora da ABCB- pelo Banco do Brasil. Apesar do pedido ser embasado no caso da Atlas, o CADE está investigando a conduta do Banco do Brasil, Bradesco, Itaú Unibanco, Santander Brasil, Banco Inter e a cooperativa Sicredi em relação ao fechamento de contas de empresas brasileiras de criptomoedas.

A ABCB argumentou na representação que a manutenção das contas bancárias é essencial e indispensável à atividade empresarial da Atlas e que o acesso ao sistema financeiro tradicional é uma infraestrutura essencial à própria sobrevivência de qualquer agente econômico numa economia capitalista. Além disso, a ABCB também destaca que o caso não é isolado e que os grandes bancos brasileiros têm encerrado contas de forma anticompetitiva e lesiva os empreendedores do setor de criptomoedas, ferindo a livre concorrência.

No protocolo de representação, a ABCB pediu algumas concessões de medida preventiva:

Abstenção de encerramento de contas às operadoras de criptomoedas;
Reabertura imediata e irrestrita de todas as contas encerradas/fechadas das operadoras do mercado de cripto-ativos;
Que não haja imposição de qualquer dificuldade à abertura de novas contas as empresas do segmento.
Em investigação, o CADE consultou as seguintes empresas: Atlas, Braziliex, Profitfy, BitBlue, CoinBR, Walltime, Foxbit, Bitcoin Trade e e-juno, buscando avaliar a existência de infrações de ordem econômica dos bancos comerciais que estariam se recusando a prestar serviço às corretoras de criptomoedas.

O CADE enviou para as empresas 11 (onze) perguntas, pedindo informações sobre a inocorrência de encerramento e negação de abertura de contas, precauções para evitar fraude e lavagem de dinheiro, medidas de Know Your Customer (KYC), monitoramento das transações e etc.

Em resposta ao ofício enviado aos bancos, eles justificaram ao CADE, que as contas foram fechadas pela ausência de dados básicos sobre os clientes, exigidos pela legislação de prevenção à lavagem de dinheiro (AML) e a ausência de um código de Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE).

O Itaú Unibanco por exemplo, argumentou que as movimentações financeiras de alta volume realizadas pelas corretoras não apresentam compatibilidade com as informações apresentadas e podem configurar indício de ocorrência de crimes previstos na Lei 9.613/98. O Banco Inter se defendeu salientando que não possui qualquer interesse em vedar a abertura de contas e que seus procedimentos só observam as leis de PLD (Política de Prevenção à Lavagem de Dinheiro).

O último e-mail (07/01/2019) da ABCB encaminhado ao CADE, adiciona ao inquérito informações relativas à decisão judicial proferida pelo Tribunal de Defesa da Livre Concorrência do Chile, que manteve a medida preventiva obrigando os bancos a abrirem a abrirem ou manterem as contas correntes das empresas do setor de criptomoedas.

10. Frente Parlamentar Mista de Blockchain e Ativos Digitais
No dia 05 de setembro de 2018, foi criada a Frente Parlamentar Mista de Blockchain e Ativos Digitais na Câmara dos Deputados. A frente é formada pelo deputado Antonio Goulart (PSD-SP), responsável pela iniciativa, o deputado Daniel Coelho (PPS-PE) e a deputada Mariana Carvalho (PSDB-RO). E recebe o suporte da Associação Brasileira de Criptomoedas e Blockchain (ABCB).

O deputado Antonio Goulart tem se mostrado bastante interessado nas moedas digitais. Em junho, ele presidiu uma audiência pública tratando do tema na Câmara dos Deputados. Segundo o deputado, a frente “vai fomentar o debate, trazer perspectivas, discutir o que outros países vêm fazendo em termos de regulação”.

11. Superior Tribunal de Justiça (STF)
Em dezembro de 2018, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu é a Justiça Estadual é quem deve julgar os casos que envolvam crimes com moedas digitais. O relator do conflito, ministro Sebastião Reis Júnior afirma que não havendo indícios de crime de competência federal, as atividades suspeitas devem ser investigadas em esfera estadual. Segundo o Ministro:

“A negociação de bitcoin não poderia ser investigada com base nos crimes previstos pela legislação federal. Com efeito, entendo que a conduta investigada não se amolda aos crimes previstos nos artigos 7º, II, da Lei 7.492/1986, e 27-E da Lei 6.385/1976, notadamente porque a criptomoeda, até então, não é tida como moeda nem valor mobiliário”.
A decisão é resultado da Consulta Processual CC 161123, em que a A 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça determinou que a 1ª Vara de Embu das Artes (SP) julgue um caso envolvendo criptomoedas. Segundo o STJ as criptomoedas não apresentam natureza jurídica nem de moeda e nem de valor mobiliário e devem ser julgadas em Justiça Estadual.

12. Conclusão
O aumento do interesse nas moedas digitais tem causado grande polêmica e controvérsia entre os órgãos governamentais, associações, parlamentares e usuários no Brasil e no Mundo. A ampliação do uso das moedas digitaiscomo meio de pagamento ou investimento, torna a regulamentação inevitável. O ponto deixa de ser se a regulamentação das moedas digitais irá ocorrer e o foco incide sobre QUAL será o formato dela.

Atualmente, os posicionamentos são incipientes e contraditórios. É também importante destacar que a definição das regras do mercado de criptomoedas em países economicamente relevantes terá grande impacto na definição dos moldes da regulamentação no Brasil. No momento, é cedo para mais conclusões e o overview sobre a regulamentação das moedas digitais no Brasil buscou simplesmente mapear o cenário que está se desenvolvendo.
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