Oi andredcavalcante, que bom que você demonstrou interesse na disussão, vamos aproveitar e fazer uma prévia aqui e assim podemos tirar algumas conclusões.
Eu estava apenas tentando levantar o alerta pra desinformação que existe acerca do tema, mas tudo bem, seu comentário contribui pro tópico do mesmo modo, só não se esqueça de citar as fontes da próxima vez pra dar respaldo às afirmações e ajudar os colaboradores a encontrar novos recursos de informação.
Primeiro ponto levantado:Em particular, bitcoin NÃO É MOEDA (oficialmente no Brasil), nem mesmo valor mobiliário (não é "título emitido por entidade pública ou privada..." - faça uma pesquisa em
http://www.cvm.gov.br/ e verá que não é brincadeira.
Logo, quem está com falta de informação é você.
Concordo plenamente: o Bitcoin não pode ser considerado moeda nem valor mobiliário.
Neste sentido manifestou o Ministro do STF, Eros Grau
1:
"A moeda, pois, não é senão um nome sacralizado pela ordem jurídica. Em 30 de junho de 1994 ano o "real" passou a ser moeda [= unidade monetária> brasileira única e exclusivamente porque assim o disse, definindo-o como tal, o direito positivo brasileiro, inovado pela Medida Provisória 542/94. Todos as demais unidades monetárias como tais definidas pelos ordenamentos jurídicos de outros Estados não revestem, no quadro do direito positivo brasileiro, a qualidade de moeda. Não encerram os atributos monetários de validade e eficácia indispensáveis ao cumprimento de sua função de padrão de valor e de liberação de débitos pecuniários. Podem, é certo, consubstanciar reserva de valor, objeto de avaliação patrimonial, coisa no sentido jurídico [= elemento que se inclui no patrimônio de sujeito de direito>, constituindo instrumento de pagamento nos mercados externos. Seu comércio é, contudo, submetido a regras próprias e específicas."Ou seja, o Bitcoin não é moeda simplesmente por não ser reconhecido como tal pelo Estado brasileiro.
E como você bem citou, Bitcoin não pode ser considerado valor mobiliário, pois não existe qualquer entidade emissora de Bitcoin, fator próprio e incondicional à sua classificação nos moldes da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965 que em seu artigo 2º enumera de forma taxativa os valores mobiliários que devem se sujeitar à sua regulamentação.
O Bitcoin é um bem móvel incorpóreo, não consumível, divisível e fungível. Deste modo assemelha-se perfeitamente aos bens denominados commodities. Neste sentido este artigo defende essa posição segundo a legislação americana (em inglês):
What U.S. Regulations Apply to Bitcoins as Commodities?Segundo ponto levantado:Ah! Escambo não pode ser tributado, simplesmente porque não há meios de se verificar o escambo - não há nota fiscal, título de propriedade etc., envolvido na transação
Mais uma vez, o governo pode a vir tributar transações em bitcoins a partir do momento que reconhecer como título válido para transações comerciais e/ou moeda estrangeira.
Esta afirmativa é um pouco perigosa, por isso terei cautela em discordar. Eu gostaria muito de ouvir pontos contrários.
O "escambo" é conhecido modernamente na figura da troca ou permuta, prevista em nosso Código Civil pelo artigo 533.
Seguindo o nosso raciocínio anterior, a permuta envolvendo Bitcoins é caracterizada como alienação de bem móvel. Portanto, entendo ser obrigatória a emissão de Nota Fiscal em interpretação ao artigo 1º da Lei no 8.846, de 21 de janeiro de 1994:
"A emissão de nota fiscal, recibo ou documento equivalente, relativo à venda de mercadorias, prestação de serviços ou operações de alienação de bens móveis, deverá ser efetuada, para efeito da legislação do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, no momento da efetivação da operação.
1º O disposto neste artigo também alcança:
[...]
b) quaisquer outras transações realizadas com bens e serviços, praticadas por pessoas físicas ou jurídicas." (grifo meu)
O raciocínio lógico de redução ao absurdo nos leva ao mesmo caminho: seria uma bela brecha tributária utilizar apenas de uma rede de escambo criando um "commodity" paralelo com características de moeda para evitar todo tipo de tributação.
Mesmo não existindo ganho de capital, o que acarretaria o pagamento de Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza, entendo que incidem os demais tributos normalmente.
Por exemplo, tributos como Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis podem incidir em uma compra de uma casa usando Bitcoins; um advogado que oferece serviços em troca de Bitcoins deve recolher o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza; uma "permuta" para obter uma mercadoria poderia gerar a tributação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços etc.
Encontrei também alguns artigos que especificam a necessidade de emissão de Nota Fiscal no caso de permuta do ponto de vista contábil:
Permuta;
Operação exige nota fiscal e rigor contábil;
Notícia: Permuta é tributada como venda;
Devo ou não aceitar pagamento em permuta?.
Portanto, prefiro agir com cautela e aceitar essa hipótese até que seja provado o contrário.
Terceiro ponto levantado:Sobre o fechamento de uma casa de câmbio de bitcoins: tem o mesmo efeito se você tiver deixado dinheiro em um banco em um paraíso fiscal e o banco for roubado ou fechado de alguma forma: perde o dinheiro investidon não há para quem apelar - simples assim.
Outro ponto controverso que terei que discordar.
Realmente, caso a casa de câmbio fosse sediada em outro país a dificuldade em buscar uma indenização seria maior, mas se a sede fosse no Brasil o raciocínio seria mais simples: apropriar-se indevidamente do dinheiro alheio ou dos bens de um cliente (no caso Bitcoins) acarreta em responsabilização na esfera cível e penal.
E mais: caso não exista um registro civil da pessoa jurídica, é possível afirmar que o responsável pela
exchange responderia pessoalmente pelo ato ilícito e, mesmo se esta fosse registrada, a pessoa jurídica poderia ser desconsiderada. Esta última hipótese ocorreria, por exemplo, se um sócio passasse a confundir seu patrimônio com o patrimônio da própria sociedade.
Quarto ponto:Sobre aceitar bitcoins na loja: basta o lojista querer.
Este ponto também entendo como simples: já que trata-se de permuta, basta o lojista querer aceitar Bitcoins como forma pagamento.
É necessário atentar que o lojista deve emitir a nota fiscal como recomendado e não pode recusar-se a receber o valor em reais pelo disposto no artigo 43 do Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941. Do mesmo modo, ninguém é obrigado a aceitar Bitcoins como forma de pagamento, ainda que este represente quantia superior ao valor devido (art. 313 do Código Civil).
Perdoem o tamanho do texto, mas espero ter contribuído para a discussão.
Conclusões diferentes e comentários adicionais são muito bem-vindos.
Abraços
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1 STF. Pleno. Moeda. Dinheiro. Conceito de moeda, curso legal e curso forçado. Amplas considerações do Min. Eros Grau sobre o tema. Lei 1.807/1953. Lei 4.131/1962, art. 23. Lei 8.880/1994. Dec.-lei 857/1969, arts. 1º e 2º. Disponível em: .